O relato de uma doente que sobreviveu ao novo coronavírus
Ana Maria Nogueira Santos Loura, Técnica de Telecomunicações Aeronáuticas na ilha de Santa Maria, conhecida activista, considerada “mulher da guerra”, envolvida em várias causas sociais e culturais na ilha de Santa Maria, foi apanhada nas malhas do coronavírus. O Diário dos Açores desafiou-a a contar a sua experiência e, com a coragem e desassombro habituais no carácter de Ana Loura, deixou-nos esta mensagem.
Ana Maria Nogueira Santos Loura, Técnica de Telecomunicações Aeronáuticas na ilha de Santa Maria, conhecida activista, considerada “mulher da guerra”, envolvida em várias causas sociais e culturais na ilha de Santa Maria, foi apanhada nas malhas do coronavírus. O Diário dos Açores desafiou-a a contar a sua experiência e, com a coragem e desassombro habituais no carácter de Ana Loura, deixou-nos esta mensagem.
A passagem do Coronavírus na minha vida
Vim dos Açores no dia 17
de Fevereiro, para estar presente no Correntes
D’Escritas (de 19 a 22), e depois substituir a senhora que presta serviço
em casa da nossa Mãe para que gozasse as férias. Sofro de rinite alérgica e já
estava em plena crise com bastante tosse. Estive debilitada durante todo o
acontecimento. Convivi com amigos que só vejo nesses dias, pessoas que, como
eu, não perdem o Correntes, e com os
escritores de quem sou amiga há anos e os que fui conhecendo lá ao longo das
edições a que assisti. O Correntes é,
para além da importância que tem em termos literários, um encontro de amigos.
A minha saúde piorou
substancialmente a partir do dia 24 de Fevereiro. Febre como há muitos anos não
me lembro de a ter, dores no corpo, falta de forças, uma tosse que me abalava,
falta de ar. Era um enorme sacrifício cuidar da minha Mãe como eu gostava e
como ela merece. Fui tomando uns Brufens, o Maxilase, a bromalina, a
quercitina, cisteína e mais de um xarope que havia cá em casa. As noites eram
de pesadelo, 40º de temperatura, os lençóis alagados, as forças a falharem. Mas
na esperança de que os medicamentos me aliviassem. Eu não podia adoecer.
No dia 28 respirava cada
vez pior. Os pulmões não queriam, a expectoração era esverdeada, pastosa, e só
depois de muito tossir expelia do tamanho de uma moeda de 2 cêntimos. O resto
ficava lá dentro a impedir os pulmões de expandirem. Era a asfixia. No final do
dia, quando a senhora que apoia a nossa Mãe à noite chegou, fui à Santa Casa da
Misericórdia de Vila do Conde. Tinha a garganta já com pontos brancos. Fui
auscultada e o médico disse que não estava mal a nível pulmonar, era mais a
nível brônquico. Vim com uma receita de: Bilastina, Azitromicina, Erdosteína
Etodolac e Prednisolona. Fiz o tratamento durante os seis dias recomendados e
os sintomas não diminuíam. As forças cada vez eram menos e a falta de ar era
muita.
Entretanto saiu a
notícia de que Luís Sepúlveda estava infectado pelo Coronavírus. Não estive em
contacto directo com ele. Mas o facto fez-me pensar que eu estar infectada
seria uma possibilidade já que os sintomas coincidiam com o que era dito pela
Comunicação Social e as autoridades nacionais de Saúde. No dia 01 de Março
liguei para a Saúde 24. Após minutos “infinitos” de espera, fui atendida pela
primeira de três pessoas a quem expliquei pormenorizadamente os sintomas, que
tinha estado no Correntes embora sem
contacto directo com Luís Sepúlveda. Passou a chamada a uma segunda pessoa a quem
tive de repetir tudo. Esta segunda pessoa passou-me a uma terceira a quem
voltei a contar tudo. Informou-me que seria contactada pelo Delegado de Saúde.
Esperei, esperei… Até ao dia 03 de Março, quando já desesperada voltei a ligar
e voltei a ser atendida por mais três pessoas, a quem voltei a contar tudo e
que me prometeram, mais uma vez, que seria contactada pelo Delegado de Saúde.
Fui de facto contactada pelo Delegado de Saúde à terceira tentativa, feita no
dia 05 de Março. O senhor Delegado, a quem contei pela décima vez o historial
todo, disse que me ligaria dentro de momentos, o que cumpriu. Disse-me que, não
tendo tido contacto directo com o escritor, o meu caso “não se enquadrava” no
vírus. Insisti nos sintomas que, apesar do tratamento que estava a fazer há 6
dias, não diminuíam e muito menos desapareciam. O senhor insistiu que o meu
caso “não se enquadrava” e que voltasse a uma consulta onde já tinha ido ou
recorresse ao Hospital da Póvoa de Varzim, recomendando que não mencionasse o
facto de ter estado no Correntes para
não atrasar o processo da consulta pois, e mais uma vez, a minha doença “não se
enquadrava” no Corona. Este “não se enquadrar” foi reafirmado pelo mesmo senhor
Delegado no dia 13 quando lhe comuniquei que estava internada no São João,
positiva: “Na altura a sua situação não cumpria os critérios então definidos
para validação e que foram entretanto alterados”.
Nesse dia 05 de Março,
ao fim da tarde, voltei ao Atendimento Permanente da Santa Casa de Vila do
Conde. A médica que me viu pediu análise ao sangue. Eu tinha a garganta e o
céu-da-boca cheio de pústulas. Foi-me feito também um RX aos pulmões. A médica
achou por bem pôr a situação à consideração de uma colega de Medicina Interna.
Não o tendo conseguido, disse-me que no dia seguinte eu seria contactada, o que
aconteceu no dia 06, e me foi pedida nova ida ao Atendimento Permanente. O
médico que me atendeu, o mesmo da primeira consulta, disse que após conversa
com a colega da Medicina Interna tinham concluído que me deveria ser realizado
uma TAC. Após análise do exame, foi-me prescrito novo tratamento:
Levofloxacina, 500mg, Levofloxacina 250mg (para serem tomados em simultâneo);
Paracetamol 1000mg; Etodolac 400mg; Pantoprazol 20mg; Duobiotic.
Adiei, nesse dia, o meu
voo de regresso a casa. Não me sentia em condições para viajar e nessa altura
já temia estar de facto infectada e não seria sensato o contacto com mais
pessoas.
Os sintomas não diminuíram
com este novo tratamento. Eu arrastava-me, ardia em febre, mal respirava. Entretanto,
a senhora que presta serviço em casa da minha Mãe regressou no dia 07 a meu
pedido, e eu pude ficar na cama que era o que o meu corpo há muitos dias pedia.
No dia 11 pelas 10:15 da
manhã voltei ao Atendimento Permanente, de táxi, como já me tinha deslocado das
duas últimas vezes. Fui atendida pela mesma médica do dia 05. Olhou para a TAC
e de imediato me encaminhou para uma salinha onde fiquei em isolamento, e ela
acompanhou-me já vestida de cima a baixo com os fatos que vemos nas
reportagens. Desencadeou o processo, e cerca das 05h20 da madrugada do dia 12
fui de ambulância para o Hospital de São João “com a roupa do corpo” e num
estado físico nunca sentido antes, o ânimo do pior possível. Eu estaria
infectada. Faltava o teste. A viagem foi tenebrosa. A máscara a tapar-me o
nariz e a boca. A asfixia era cada vez maior. Eu não respirava. Tentava e não
conseguia. A viagem foi um tormento.
Chegada ao Hospital, eu
já não raciocinava e tudo, neste momento é nubloso. Apenas recordo que fui
metida num quarto por pessoas vestidas dos pés à cabeça como se fossem às
colmeias buscar o mel. Pediram que trocasse a minha roupa por uma daquelas
batas com que ficamos meias nuas. Lembro que me enfiaram os cotonetes gigantes
pelo nariz e pela boca. Puseram-me a oxigénio. No dia seguinte veio o
veredicto: POSITIVO. Mudaram-me de quarto para a Infecciologia. Quarto de
pressão negativa. Fiquei a oxigénio, mas este era diferente: húmido e morno. Um
monitor 24 horas por dia ligado a dar os sinais vitais e o nível de oxigénio
medido num dos dedos com uma “pinça”, o oxímetro. O monitor apitava quando o
oxigénio descia para valores mínimos. De quando em vez, entravam enfermeiros no
quarto para me verificarem os sinais vitais, medirem a pressão sanguínea, e tirarem
sangue. O cateter na veia ficou durante 22 dos 23 dias de internamento, por
onde injectavam o antibiótico. Tomei o tal comprimido para a malária. Primeiro
inteiro, e depois só metade. Tiravam duas vezes por dia sangue das artérias dos
pulsos para analisar os níveis de oxigénio no sangue arterial. Eu estava num
limbo, quase sonâmbula.
Porque a minha Mãe fazia
parte do grupo de risco devido aos seus quase 95 anos, foi de imediato
desencadeado o processo de recolha dos mucos, o que aconteceu na madrugada do
dia 13. O resultado foi comunicado à empregada dela no Domingo ao final da
tarde. POSITIVO. Um dos momentos mais dramáticos da minha vida. EU TINHA
INFECTADO A MINHA MÃE. Meu Deus! Chorei, gritei com as poucas forças que já
tinha. Valeu-me o apoio de uma médica, a Dra. Cândida. Acompanhou o processo e
aconselhou que a minha Mãe não saísse de casa já que não apresentava sintomas e
foi cancelada a sua entrada no Pedro Hispano. Estou-lhe eternamente grata.
Entretanto, um Delegado de Saúde, o Dr. António, acompanhou diariamente a
situação da minha Mãe e da minha filha que tinha vindo de Lisboa para cuidar da
Avó nas 24 horas do dia, mesmo correndo o risco de ser contagiada, já que as cuidadoras
passaram à situação de quarentena. Seguiu à risca todas as indicações do
Delegado de Saúde. A minha irmã Margarida disponibilizou as primeiras máscaras
que a Ângela devia usar durante a viagem de comboio de Lisboa para o Porto. Amigas
e duas primas “viraram o mundo do avesso” para lhe arranjarem máscaras, luvas e
gel para as semanas que se seguiram.
As minhas forças, que já
eram poucas, passaram a desespero, a impotência. A tosse e a falta de ar eram
imensas. Apesar disso teimei em tomar banho e comer sozinha. Eu tinha que
lutar. Nunca pensei que morreria. Rezei. Muito. Cantei baixinho “O Senhor é meu
Pastor” e “Confiarei”. Ancorei-me no pessoal que tão bem cuidava de mim, me
acenava sorrindo quando passava pela porta do quarto, no Deus em quem acredito
e nos muitos amigos e familiares que me ligaram, alguns várias vezes por dia,
outros com menos frequência com receio de me cansarem. Que bem me fizeram! No
segundo ou terceiro dia, não sei precisar, um dos médicos, creio que Paulo,
entrou no quarto e disse-me: estamos a ponderar em induzir-lhe o coma e
ventilá-la. Pensei: isto está mesmo mau, mas seja. Confia. As horas passaram e
enfermeiros entravam e mediam tensão, baixinha, o oxigénio ainda mais baixo.
Mas os valores foram subindo devagarinho. No dia seguinte, uma das médicas – não
sei qual pois só lhes via os olhos – disse que estava a reagir bem ao
tratamento e o coma induzido estaria fora de questão.
A partir de um dia que
não sei precisar, começaram a injectar-me na barriga. Dias depois perguntei
para que era. Para prevenir coágulos. No dia 18, foi-me feito uma TAC e
mudaram-me de quarto para outro, na Ginecologia- internamento, de 3 camas onde
estava a Catarina da “cadeia” da ida a Itália dos industriais de calçado. Eu
tinha vencido a crise, embora ainda positiva. Os Cuidados intensivos tinham
ficado para trás. Eu tinha recuperado algumas forças. Estava bem para o que
tinha estado. Da janela deste quarto já se via vida lá fora, uma árvore onde
por vezes pousava um melro e quando eu me levantava, pessoal do hospital
sentado numa escada de incêndio a tomar café e a conversar. Da janela do outro quarto
via tubos metálicos. A Catarina foi uma boa companhia. Entretanto chegou a Dona
Fátima, infectada, tosse idêntica à minha dos primeiros dias, como se o mundo
fosse acabar. Iniciei aí a minha “missão” de apoio. Ir à porta do quarto buscar
as refeições, pôr água no copo, ajudar a ir à casa de banho. Entretanto a
Catarina “negativou”. Fiquei feliz por ela. Mantemos contacto. Saiu a Catarina
e entrou a Dona Florinda, frágil nos seus 83 anos, olhos azuis vivos e sorriso
de menina. Tinha dificuldade em caminhar sem apoio e puseram-lhe uma fralda.
Ficou com ar desanimado. Por duas vezes lhe puseram a aparadeira. Constrangida,
lá fez o que precisava. Às tantas teve, novamente, necessidade de ir ao quarto
de banho. Percebi. Toquei na campainha e, passado um bom bocado, uma assistente
meteu a cabeça na porta e perguntou o que se passava. Respondi que a senhora
estava “à rasca para urinar”. Resposta: “não tem fralda?” Faça. Vi naqueles
olhos azuis uma imensa tristeza. Levantei-me e ajudei-a. Desde esse momento
tomei nas minhas mãos a protecção daquela mulher que já tinha pesado há anos
oitenta e tal quilos, trabalhara nos campos da família debaixo de sol desde o
seu nascer ao seu pôr e entretanto, por problemas na saúde, agora era de
aspecto frágil mas de uma postura, a que normalmente chamamos de nobre.
No dia 30 de Março
mudámos as duas para um quarto da Cirurgia vascular. No quarto que deixávamos,
ficou uma senhora vinda do Dubai numa viagem de férias, infectada. Entretanto a
D. Fátima tinha ido para casa, ainda positiva. A senhora que se lhe seguiu e
tinha dado à luz um menino, também foi para casa positiva e onde estavam uma
filha de uns sete anos e o marido. A D. Florinda na cama, eu e mais dois
doentes, um deles o piloto que desmaiou aos comandos do avião, o Sr. Ismael (se
a memória não me atraiçoa) percorremos corredores intermináveis em pijama, saco
de plástico com os nossos haveres na mão. Estava a ver que não chegava ao fim
“da estrada”. Deste quarto a vista era ampla. Virada a nascente/sul. Via o sol
nascer, as andorinhas. Levava a D. Florinda à janela para ver a paisagem. A
terceira cama ficou vaga durante alguns dias. Quando saí, nesse quarto ficou
uma mulher que, pelos electrocardiogramas, acompanhamento durante toda a noite
em que chegou ao quarto, não estaria nas melhores condições e para além disso
teria algum grau de demência pois gritava dia e noite.
No dia 04 de Abril, em
que saí, a D. Florinda ficou a chorar sem saber como iria ser a partir daquele
momento: quem iria ligar a televisão para a Missa, quem iria tirar as espinhas
do peixe, cortar a carne, pôr a manteiga no pão, quem iria pô-la a falar com a
família através do messenger.
A alta médica (data em
que fui considerada clinicamente curada mas não negativa ao vírus) teve lugar
no dia 24 de Março. A partir daí, comecei a ser pressionada para voltar a casa
dos meus Pais, mesmo estando positiva. Foi uma luta. Eles, que a casa tinha
condições. Eu, que não, que a minha Filha estava a cuidar da minha Mãe que
estava positiva, que tendo eu infectado a minha Mãe sem ter consciência disso,
não iria voluntariamente correr o risco de infectar a minha Filha. Que lhe
fizessem o teste e caso esse desse positivo eu regressaria a casa.
Contrapuseram que eu estava a ser egoísta e estava a ocupar uma cama que estava
a ser precisa. Tentaram incutir-me sentimentos de culpa. À última médica que me
veio pressionar eu disse que ela e o hospital me estavam a obrigar a infectar a
minha Filha. Ficou fora de si, deu meia volta e bateu violentamente a porta do
quarto. Mais uma vez, quem salvou a situação foi o Dr. António, que para
proteger a Ângela exigiu a minha permanência no São João. Entretanto, comecei a
ter acompanhamento psicológico pela Dr. Sandra. Penso que ela terá tido,
também, uma palavra a meu favor neste processo.
Os meus testes andaram
durante dias a “dançar” entre o positivo, negativo, inconclusivo, positivo,
negativo, NEGATIVO. No dia 05 de Abril deixei o Hospital de São João rumo a
casa dos meus Pais numa ambulância da Cruz Vermelha. Vários funcionários vieram
ao corredor despedir-se. Agradeci. No fundo, o balanço do meu internamento foi
positivo. Estou viva!!!!
Passados que são 24 dias
da minha alta efectiva, ninguém mais, excepto o Dr. António enquanto os dois
testes à minha Mãe não deram negativos (para que a vida cá em casa regressasse
à normalidade possível, e para o Dr. decretar o fim do isolamento
profilático da Ângela), o último a 15 de Abril, me perguntou se tenho
falta de ar (que ainda tenho), se me canso (ainda muito), se a memória que já
era fraca está pior (muito pior), se estou bem (que ainda não estou). É
estranho o abandono pós internamento. Vemos as notícias e uns dizem que há
imunidade, outros que não; uns que não há reinfecção, outros que há. uns que ficam sequelas, outros que não (acredito que sim,
sinto-as).
Estou em casa dos meus
Pais, é certo. Mas estou fora do meu domicílio há dois meses e meio. A previsão
de voo Porto/Ponta Delgada é para 20 de Maio. Se os procedimentos não se
alterarem terei de permanecer fechada num quarto de hotel durante 14 dias
(depois de 23 de internamento e estes dias todos confinada em casa com raras
saídas para abastecer o frigorífico e a dispensa). Previsão de chegada a casa é
03 de Junho. Cerca de 107 dias depois de ter saído. Haja paciência e saúde, e
acrescento o que acrescentaria o meu Pai se fosse vivo: E coza o forno.
Nunca afirmei ou me
convenci de que fui infectada no Correntes.
Não tive contacto directo com Luís Sepúlveda. Amigos comuns tiveram contacto
muito mais próximo e não foram infectados. O contágio pode ter acontecido no
Aeroporto de Ponta Delgada no dia 17 de Fevereiro, no de Pedras Rubras no mesmo
dia, nos autocarros que usei para ir para a Póvoa. Não sei se faço parte de
alguma cadeia. Nunca ninguém me perguntou nada. Não tenho a noção, nem do
local, nem do momento. O certo é que estava debilitada desde há alguns dias,
defesas em baixo. [Hoje, dia da morte do meu querido Luís Sepúlveda, continuo a
duvidar que o meu vírus tenha vindo dele]. O certo, também, é que o Atendimento
Permanente da Santa Casa de Vila do Conde fechou de imediato, o MADI entrou de
quarentena, assim como os dois taxistas que me transportaram.
Mas “Vai ficar tudo bem”
para quem como eu e a minha Mãe sobrevivemos. Pelo menos para já.
Quero deixar o meu
alerta: sofri muito, isto é tenebroso. Vale a pena tomarem todas as precauções.
Não facilitem. Ele, “o bicho mau, com picos e uma coroa”, como lhe chama o meu
amigo escritor António Mota nas cartas diárias ao seu neto nesta quarentena,
não dorme e efectivamente MATA. E se não mata faz-nos passar momentos
terríveis. FIQUEM EM CASA, PROTEJAM-SE. A prevenção é a cura mais certa. O
confinamento e as quarentenas são difíceis de viver. Mas muito mais difícil é
sofrer, e para muitos morrer na mais dolorosa asfixia. É igual a enfiarmos a
cabeça num saco de plástico.
Nem todos vamos ficar
bem. Mas façamos parte do número dos que se vão prevenindo, ficando em casa,
lavando e desinfetando as mãos, usando máscara e o distanciamento.
A minha gratidão à Dra.
Rita da Santa Casa, que ao “desconfiar” que eu estaria positiva me salvou a
vida; à Dra. Cândida do Hospital de São João; ao Dr. Paulo e a todos os outros
que nos Cuidados Intensivos cuidaram de mim; ao Dr. António pelo acompanhamento
à Ângela e à minha Mãe, e no fundo a mim, pelos conselhos de como higienizar a
casa que deu à minha filha e de como se proteger e proteger a Avó; à Dra.
Sandra pelo ânimo que me foi dando; aos meus amigos e familiares que me
acompanharam diariamente; à Dra. Inês do Centro de Saúde de Vila do Conde. À
minha Filha que se sujeitou ao vírus e fez um trabalho titânico nas 24 horas
dos 23 dias em que sozinha cuidou da Avó e nos dias seguintes de mim debilitada
e me aturou quando eu não fazia bem as coisas nos cuidados à minha Mãe e à casa
conforme as direcções do Delegado de Saúde. Nunca a família lhe agradecerá o
suficiente.
Abraços de quem
sobreviveu, pelo menos por enquanto. CUIDEM de vocês. FIQUEM EM CASA,
PROTEJAM-SE
AZURARA, 28 de Abril de
2020
Ana Loura